Salário mínimo com aumento de R$ 100 e restrição no BPC é o corte do governo federal

 

Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Texto foi aprovado posteriormente pelo Senado e seguirá para sanção presidencial

    O Senado aprovou nesta sexta-feira (20) o projeto de lei que restringe o acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e limita o aumento real do salário mínimo (PL 4.614/2024). Ele faz parte do pacote de corte de gastos do governo federal. Pelas novas regras, o reajuste do salário mínimo acima da inflação deverá ser de, no máximo, 2,5% de crescimento da despesa primária. O projeto recebeu 42 votos favoráveis e 31 contrários, e segue para a sanção presidencial.

O ponto que mais desagradou os senadores, uma mudança no BPC que restringe o benefício a pessoas com deficiência grave e exige avaliação médica, será vetado pelo Palácio do Planalto, segundo o líder do governo, senador Jaques Wagner (PT-BA).

No Senado, o projeto foi relatado pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE). Ele frisou que o texto também estabelece crescimento real do salário mínimo em pelo menos 0,6%, independentemente do desempenho econômico do país.

— Mesmo que tenhamos crescimento zero ou negativo do PIB, será garantido o crescimento do salário. O texto protege os benefícios sociais para que não sejam desvinculados do salário mínimo. Todos os benefícios previdenciários e assistenciais da seguridade social que são concedidos estarão atrelados ao salário mínimo, com a garantia de aumento real anualmente — observou.

Rogério rejeitou todas as 14 emendas apresentadas pelos senadores durante a votação, mantendo o texto que veio da Câmara dos Deputados, que ele considerou "bastante equilibrado". Além disso, Rogério lembrou que a aprovação de emendas resultaria na necessidade de retorno do projeto à Câmara, o que atrasaria o início da vigência das novas regras.

Líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN) criticou a proposta. Segundo ele, é necessária uma "visão sistêmica" dos impactos dela sobre os benefícios da Previdência Social e da assistência social — como o BPC, o Bolsa Família e as aposentadorias — que são calculados de acordo com o salário mínimo, representam os maiores gastos orçamentários da União e são despesas obrigatórias. 

Marinho defendeu que a solução envolve corte de gastos em diversas áreas, especialmente dos salários de autoridades, que foi objeto da PEC 54/2024, aprovada na quinta-feira (19) no Senado. 

— O exemplo precisa vir de cima. Não adianta impormos à parte mais frágil o peso dos ajustes necessários à nossa economia se não fizermos o mesmo com todos, principalmente com aqueles que podem contribuir mais. Há um equívoco de avaliação de cenário. Ou temos uma visão sistêmica e atacamos o todo, ou iremos, como sociedade, para um caminho muito ruim — sentenciou.

O projeto faz parte do pacote de propostas do governo federal para diminuir as despesas obrigatórias — com pessoal, aposentadorias e benefícios sociais — a fim de preservar margem para gastos com programas governamentais, custeio e investimentos. Apresentado pelo líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), o projeto foi aprovado na forma do substitutivo apresentado pelo deputado Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL).

Salário mínimo 

Um dos pontos do texto é a regra para o reajuste do salário mínimo, que entre 2025 e 2030 deverá seguir o Novo Arcabouço Fiscal, de 2023. Além do crescimento mínimo assegurado de 0,6%, o reajuste poderá ser maior se a receita primária crescer mais, porém sempre limitado ao teto de 2,5% em relação ao ano anterior. Todos os benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no valor de um salário mínimo serão afetados. 

O texto prevê que até 2030 o aumento real do salário mínimo seja vinculado aos índices anuais efetivos de crescimento das despesas primárias. Desse modo, a alta do salário mínimo continua a prever aumento acima da inflação com base no Produto Interno Bruto (PIB), mas ficará limitado ao crescimento das despesas dentro do arcabouço fiscal, que crescem no máximo 2,5% ao ano. 

Atualmente, a correção real acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é equivalente à taxa de crescimento real do PIB do segundo ano antes da vigência do novo salário. Como o PIB de 2023 que seria utilizado na conta para 2025 foi revisto para 3,2%, a mudança nas regras deve levar a uma economia de R$ 5,2 bilhões de acordo com projeções feitas pela equipe econômica do governo federal. 

A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2025 (PLN 3/2024), aprovada pelo Congresso Nacional na quarta-feira (18), prevê o salário mínimo de R$ 1.502 e déficit de até R$ 31 bilhões nas contas públicas no próximo ano. Atualmente em R$ 1.412, o salário mínimo deve chegar a R$ 1.502 em 2025. Sobre o valor atual, foi aplicada a reposição da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de 3,35%, mais um crescimento real de 2,9%, referente à variação do PIB de 2023.

BPC 

O Benefício de Prestação Continuada é a garantia de um salário mínimo por mês aos idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. O projeto determina que o recebimento do benefício fica condicionado ao beneficiário ter um documento com cadastro biométrico e exige atualização cadastral a cada dois anos, no máximo. Em 2023, o BPC tinha 5,7 milhões de beneficiários, dos quais 3,12 milhões eram idosos e 2,58 milhões eram pessoas com deficiência.

O projeto também estabelece que, para a pessao com deficiência, a concessão fique sujeita à avaliação que ateste grau de deficiência moderada ou grave. No entanto, a reação a esse dispositivo foi negativa no Plenário e o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), se comprometeu a garantir que ele seja vetado.

— Esse texto foi construído exatamente para revelar um acordo. Eu não mando na minha vontade, eu preciso consultar e já consultei. O governo confirmou e me comprometo aqui com o veto do segundo parágrafo que trata da necessidade de atestar a deficiência de grau moderado ou grave nos termos do regulamento — reforçou.

O pedido pela retirada do trecho foi feito, inicialmente, pela senadora Damares Alves (Republicanos-DF). 

— Fica aqui nosso apelo para a gente não estabelecer aqui apenas os graus moderado e grave, deixar apenas o termo deficiência. E lá na ponta a avaliação biopsicossocial decide se a criança e o adulto, com a deficiência leve, têm ou não direito ao benefício — solicitou ela. 

Uma das senadoras que fez fala semelhante foi Mara Gabrilli (PSD-SP). A parlamentar, que é cadeirante, apresentou aos senadores um funcionário do seu gabinete, Edgar Episcopo Teixeira, que tem síndrome de Down. Mara explicou que Edgar, conhecido como Didi, trabalha com ela há 16 anos. A senadora afirmou que o Brasil é um país que "não dá chances" para pessoas com deficiência intelectual e que deixar de fora do BPC pessoas com deficiências leves é "uma crueldade". 

— O Didi deixou o BPC e se tornou contribuinte porque teve oportunidade, algo que não acontece no Brasil. O que a gente está fazendo para essas pessoas é o inimaginável, que é o governo propor a retirada de direito dos mais pobres e mais vulneráveis. Quando escalonamos as deficiências em severas, moderadas e leves, nunca isso foi feito para tirar direitos. Isso foi feito para a gente conseguir ter uma visão mais ampla e melhorar os direitos dessas pessoas — desabafou.

'Precipitação'

O senador Sergio Moro (União-PR) criticou a pressa do Senado para analisar o projeto. O parlamentar anunciou voto contrário ao projeto, que classificou como "um presente cruel". 

— Não tem como discutirmos essa questão em regime de urgência sem passar pelas comissões e sem ouvir as pessoas afetadas. Estamos aqui em um açodamento para decidir. Há uma semana esse projeto sequer existia, e estamos aqui quase na véspera de Natal para entregar um presente cruel para as pessoas com deficiência. Não é aceitável que o corte de gastos se transforme num corte de gente, que afeta as pessoas mais vulneráveis da sociedade. 

O senador Eduardo Braga (MDB-AM) ponderou que o governo não é contra auxiliar crianças, seja com autismo, síndrome de Down ou qualquer outra deficiência. Contudo, para ele, há alguns equívocos que precisam ser corrigidos a partir da modificação da legislação vigente. 

— Segundo o IBGE, entre 2000 e 2023, a taxa de natalidade no Brasil caiu de 2,32 para 1,57 filho por mulher. Nossa população tem crescido menos. Já o aumento do benefício tem acontecido numa proporção 10 vezes maior, a uma taxa de 15% ao ano. Há algo errado nisso — ponderou. 

Outras regras

O cálculo da renda familiar exigida para concessão do BPC vai considerar a soma dos rendimentos brutos obtidos mensalmente pelos membros da família que vivam sob o mesmo teto, sendo proibidas deduções não previstas em lei. O requisito para o benefício é que a renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo — em 2025, isso representará R$ 375,50.

Para outros benefícios e programas de transferência de renda que utilizam o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), como o Bolsa Família, a atualização cadastral obrigatória passa de 48 para 24 meses, seja na concessão ou manutenção do pagamento. Se comprovado que a pessoa recebeu a notificação e não realizou a atualização, o benefício será suspenso. A antecedência mínima será de 90 dias, prorrogável uma vez por igual período, exceto para o BPC pago em municípios de pequeno porte, cujo prazo continua a ser de 45 dias. 

Também para a concessão, manutenção e renovação de benefícios da seguridade social será exigida apresentação de documento com cadastro biométrico realizado pelo poder público, nos termos de regulamento. 

Com Agência Câmara

Fonte: Agência Senado



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